Ponto de vista masculino

Gordinhos, gordinhas, estressados e estressadas, quando se dirigem ao spa em Sorocaba sempre dão uma paradinha no Tigrão. Tigrão é um posto, do lado direito de quem vai. Restaurante farto, bebidas visíveis, colesterol à vista e a prazo. É ali que eles & elas entram e se enchem, prevendo as futuras 300 calorias, as cetoses e as boboses que se avizinham. É ali que elas & eles se reabastecem, enchem o tanque e pedem perdão a São Pedro.

Foi ali que o fato se deu.

Soninha, além de viciada em comida, é viciada em spa. Lá ia ela, dias desses. Tigrão. Soninha estava de licença no spa. Depois de um mês, estivera dois dias em São Paulo. Estava voltando. Já havia emagrecido 10 quilos. Já era bastante, pra quem precisava ainda perder uns 30.

Soninha encheu a cara e a barriga e ainda pegou uns bis para matar nos quilômetros finais. Foi quando se dirigia para o caixa que ela ouviu.

Ouviu nitidamente. O assovio. Aquele que os homens fazem quando passa uma mulher gostosa. Fiu-fiiiiu. Estática, seu olho girou 180 graus. Não havia dúvida. A coisa era com ela.

Aquilo foi uma injeção de 5 mil calorias no ego dela, no superego e até no alter ego. Há quando tempo Soninha não sentia aquela sensação de quilinhos subindo pelo seu corpo num frenesi? Vinte e cinco anos? Mais? Ficou ali, estática, parada no contrapé da felicidade. Tentou dar um passo e, de novo, o assovio. Ela precisava ver quem era, senão não tinha graça. Virou-se graciosamente, com o maior charme possível que a sua Deu mais um passo. Fiu-fiiiiiu, de novo. Foi andando na direção de um macaco-boneco de uns 30 centímetros. Quanto mais ela se aproximava, mais o macaco assoviava. Era o macaco seu amante já imaginário e com milhares de planos e sacanagens na cabeça.

Era isso. Um boneco. A primeira ideia foi pegar o macaco, arrancar a pilha dele, jogar no chão, pisar seus gordinhos pés em cima dele. Mas resolveu esquecer. Afinal, ninguém havia notado seus quinze segundos de fama. Cabeça e estima baixa, já estava no carro quando resolveu voltar.

Comprou o macaco.

Na estrada, depois de dar o nome de Castanho ao macaco e ficar passando a mão na frente da boca dele para ouvir, ia feliz. A pilha era Duracel, ia durar muito.

Instalou o Castanho em cima da televisão, numa posição estratégica no seu quarto. Ia ao banheiro, o macaco Castanho assoviava. Voltava, fiu-fiiiiiu. Levantava, tava lá. Seu Cooper dentro do quarto passou a ser todo dedicado ao Castanho. Já sabia a que distância tinha de se aproximar para provocar a libido do macaquinho.

De noite quebrou a solidão com um maravilhoso striptease para ele. Só para ele. O Castanho não dizia nada, nem mexia os olhinhos, ouvindo Summertime. Só assoviava. Cada peça de sua roupa tirada era jogava na direção do bichinho. O bichinho não falhava. Soninha foi se entusiasmando e, nua, fez coisas que não fazia há muito, mas muito tempo mesmo.

A notícia do macaco Castanho logo tomou conta do spa. Gordinhas queriam comprar o levantador de baixa estima. Pensou-se em aluguel, em rodízio, em consignação. Mas Soninha não abria mão. Chegaram a oferecer dois bagos de uvas e dois palitinhos de cenoura pelo uso e abuso do animal. Mas Soninha o queria só para ela.

Foi quando a doutora Aída, psicóloga do local, conseguiu convencer a Soninha – sabe-se lá como – que o Castanho era fundamental para o spa. Que a Soninha deveria dividir seu prazer com as colegas de polegadas a mais. Soninha concordou, mas com uma condição. Tudo bem, mas só uma vez por semana e tinha de ser coletivo.

O dia escolhido foi domingo à noite. Soninha colocou seu amado amante em cima do balcão do bar do restaurante e foi então que começou a orgia. Todas entravam – muito bem vestidas, algumas decotadíssimas – e iam pra frente do balcão. Fellini morreu sem imaginar a cena. Calígula morreria de inveja. Uma a uma e depois duas a duas, três a três, desfilavam seu corpo diante do Castanho, que parecia entender o coração de cada uma delas. E não negava fogo.

Depois de umas duas horas daquela desenfreada sacanagem, o assovio foi ficando fraco, fraco. A pilha está acabando! Minha ceia por uma pilha! Meu reino por uma pilha, gritou uma. Dou cinco sobremesas por uma pilha! Mas era domingo, de noite, não tinha pilha. Trinta gordinhas, amontoadas e ajoelhadas, pediam para Castanho não parar, pelo amor de Deus.

Mas o macaco Castanho estava cansado. Não estava programado para tantas e boas meninas. Mesmo assim o spa dormiu feliz sabendo que, no dia seguinte, ia ter mais pilha. E mais: todas elas brincavam porque sabem que o prazer está na cabeça e não no corpo.