Minhas Mulheres e Meus Homens

Editora Objetiva, 1999 (relançado pela Editora Planeta em 2012). Prefácio de Marta Góes.

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Prefácio

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Saber que a agenda telefônica do Mario Prata ia virar livro estimulou algumas paranóias:

— Agora é tarde. A situação ridícula que ele testemunhou, aquela gafe que você negava já estão impressas. E o que é pior, todo mundo vai saber, porque os livros do Prata vendem muito.

Os vaidosos animaram-se:

— Aquela sacada brilhante, que ele adorou, e o meu gesto de desprendimento finalmente vão ser reconhecidos. Mas, como na prática todo mundo quer sair bem na foto, com o passar do tempo a curiosidade corroeu as seguranças.

— O Prata mostrou seu verbete? Não comentou nada sobre o meu?—perguntou-se muito nesses últimos tempos.

Os contemplados com consultas prévias tripudiaram:

— Para mim ele mandou o texto. Não mandou para você?!

Confesso que também fiquei desconfortável. Minhas mulheres e meus homens é um título alarmista para uma ex-mulher, não? Mas a aflição passou quando recebi o livro inteiro, ainda nas provas, e a encomenda de um prefácio. E a essa altura, todos já se acalmaram ou se desesperaram de vez, porque, otimista ou paranóico, a primeira coisa que você fez aqui foi procurar o seu nome no índice. Ou vai dizer que resistiu?

Este livro, ensina o autor, pode ser lido em ordem alfabética, em ordem cronológica ou, ainda, pela sequência dos nomes que um verbete remete para o outro. Pode ser lido assim e de infinitas maneiras, que cada leitor inventará de acordo com as suas próprias perguntas. O voyeur vai pular de famoso em famoso, em busca de bastidores — e não vai se frustrar. O enturmado vai querer descobrir depressa quem entre seus conhecidos virou verbete. E o leitor tranquilo, que deseja apenas boas histórias — é isso, afinal, o que oferecem os bons escritores —, vai se deliciar com 748.

É provável que exista para todos um prazer extra: identificar um pouco de sua própria vida misturada aos nomes que conhecem ou de que apenas ouviram falar, a lugares que também frequentaram e a acontecimentos dessas décadas que todos nós vivemos.

Os leitores perceberão ainda, no conjunto variado desses verbetes, a biografia do autor. É a história de um menino do interior que chegou a São Paulo tão assustado que esqueceu no táxi a mala com as roupas novinhas que a mãe tinha preparado. É a história de um escritor que premia seus leitores com a delícia do riso e com a bênção da beleza (preste atenção no jeito como ele conta que alguém morreu). É a história de um homem que enriqueceu a vida de tantos encontros, com tantas pessoas, que ao passar os olhos pela agenda de telefones compreendeu, satisfeito, que sua história dá muitos, muitos livros.

Marta Góes

Orelha

Grande honra fazer a orelha de quem, literalmente, fez as minhas – afinal, Mario Prata, o escritor cuja vida se desenrola nas 272 páginas deste livro, é, entre várias outras coisas, meu pai. É por conta dessa proximidade, aliás, que posso dizer sobre a presente obra o mesmo que a maioria das pessoas nela perfiladas afirma sobre mim: “vi nascer”.

Minhas Mulheres e Meus Homens foi gestado e parido no quarto em frente ao meu, no apartamento 103 da Alameda Franca, 732, onde moramos entre 1994 e 1999. Surgiu de uma ideia simples e deliciosa, como tantas outras tidas pelo cara que vivia do lado de lá do corredor: pegar sua agenda telefônica e escrever um verbete para cada amigo ou conhecido que tivesse uma boa história a ser contada. (A agenda era impressa no computador, não mais do que 20 folhas grampeadas, fonte Arial 10, com capa e contracapa verdes e o título, pouco original, mas sem dúvida eficiente: “Telefones”.)

Na primeira edição de Minhas Mulheres e Meus Homens, em 1999, os personagens apareciam em ordem alfabética, como na agenda. Agora, estão em ordem cronológica, escancarando o que já se vislumbrava, lá atrás: trata-se de uma autobiografia disfarçada. Trata-se, também, de uma bela crônica histórica e social: acompanhando a evolução do garoto interiorano que vem para a cidade grande ser bancário e termina um escritor consagrado, testemunhamos a revolução dos costumes; do surgimento da pílula à itervenção do Viagra, das primeiras viagens espaciais aos cliques no cyberespaço. No meio do caminho, há pessoas desconhecidas fazendo coisas extraordinárias e gente famosa em situações incomuns – a vedete que abandona a cidade de Lins, e, como vingança contra a mentalidade tacanha, decide mostrar os peitos no coreto da praça, com hora marcada; Vinicius de Moraes jogando War, às seis da manhã.

Ao terminar de ler este livro, tenho certeza de que o leitor sentirá a mesma vontade que eu: de mandar um e-mail ao autor, pedindo a continuação, com todos os personagens surgidos de 99 pra cá. Foi o que, aproveitando minha estratégica proximidade, eu fiz. Disse-me ele que, embora não haja nada garantido, tampouco está descartada uma versão ampliada, qualquer dia desses. Quem sabe, aí, eu possa preparar uma segunda orelha, e, não literalmente, mas ao menos literariamente, retribuir-lhe essas duas que, entre tantas outras coisas, ele me deu.

P.S. Devo dizer, em minha defesa e em defesa do livro, que nas bolas divididas entre a veracidade dos fatos e o sabor da narrativa o autor nem sempre ficou com a primeira opção. Assim sendo, quando passar por um topless e uma pizza estragada, em Angra dos Reis, na página 166, releve.

Antonio Prata
Jornalistax