Nada me impressionou mais no velho e bom século 20 como a invenção do liquidificador. Era ainda menino quando o aparelho – o primeiro – chegou a Lins. Meu pai avisou: vem um sujeito aqui hoje em casa fazer uma demonstração. Naquela época eu não sabia nem o que era demonstração. Vieram os vizinhos e o padre.
– Um negócio com esse nome não pode dar certo, vaticinou, profetizou, predisse, prognosticou, previu e prenunciou meu pai que tudo sabia. Como é mesmo o nome? Lidiquificador?
Deu certo. Vitamina para as crianças.
Depois veio a calça com zíper. Não vai dar certo, vai prender, machucar.
Olha o pelinho! Era com botão, antes, pra quem não sabe. E botão, você sabe, cai. Principalmente ali, onde você fica abrindo e fechando toda hora. Quem bebia muita cerveja estava sempre com um botão faltando. E a braguilha (existe palavra melhor para aquilo?) ficava sempre meio aberta. Um desaforo.
Braguilha de bêbado não tinha dono.
Apesar de ter sido inventado em 1851, foi no século 20 que o leite condensado deitou e rolou pra larica nenhuma botar defeito.
E quem foi o gênio que inventou o retrovisor do carro? Não o do motorista, o outro. Me lembro quando vi o primeiro carro com aquilo. Era americano, é claro, povo dado a olhar para trás pela direita. Pensei: um dia ainda vou ter um. Passou – durante alguns anos – a ser minha meta máxima. E logo inventaram um jeitinho da gente o movimentar sem ter que se esticar todo.
Coisa de gênio.
O fax. Quando o meu filho Antonio foi para a Itália num intercâmbio, estávamos em 1988. Outro dia. O pai de um dos garotos já tinha fax no escritório dele. Fomos para lá. Quatro famílias. O pai de um deles colocou a minha carta num buraco e me disse: já está em Roma. Pasmei, quase incrédulo.
Um dia vou ter um, pensei distante.
Em 1958, surgiu o radinho de pilha. Spika. No internato só um menino – rico, é claro – tinha. Era o nosso ídolo. Um radinho daquele tamanho, sem fio!
Pegava São Paulo! Não Diga Não, Miguel Vaccaro Neto.
E as piscinas dos clubes (e das poucas casas, também) que tinham que ser esvaziadas, lavadas e enchidas de novo? Levava três dias, a operação. A gente ficava tomando sol e os funcionários lá dentro, esfregando o ladrilho quase lamacento. Coisa nojenta. Uma vez por mês, três dias sem piscina. A gente dizia que a piscina estava naqueles dias.
E a missa era em latim. Aí inventaram de ser em português. Acabou-se o encanto, o mito e o rito. Ficou vulgar. Sabia inteira, como no Lácio.
Traduziram, virou cordeiro de Deus, nada me faltará, sumiram com a gratia plena, o dominum vobiscum! Amén!
Foram cem anos que se passaram e, até hoje, não resolveram o problema do picotado do papel higiênico. E por falar nele, continua a polêmica. O papel deve sair por cima do rolo ou por baixo? As mulheres preferem por cima, os homens por baixo. Tenho as minhas pesquisas.
Outra coisa que não deu muito certo foi a cerveja para abrir com a mão.
Acabou o século e continuamos tendo que pegar um paninho ou um pedaço da camisa. Outra coisa para pasmar: os vinhos australianos (virou moda na virada) estão usando rolhas de plástico. Me recuso! Não me faltava mais nada.
Quando era bem pequeno – antes do liquidificador – a grande invenção foi o carrinho de rolimã. Não o rolimã em si, mas o cara que inventou de fazer um carrinho com aquilo, eu admirava. O que mais era gostoso era fazer o carrinho. Cheguei a ter um com breque dianteiro. Capotei, é claro.
Também grande invenção do século 20: a pipoca. Quem foi o danadinho que descobriu que colocando o milho lá dentro do óleo fervendo, surgia a pipoca?
Parece uma invenção simples, banal, coisa do século passado. Mas pare para pensar. Alguém inventou esse troço. E, burro, não patenteou. Já pensou?
Seria tão rico como o personagem do Campos de Carvalho que patenteou o zero.
O abraço também é invenção do século 20. Antes não tinha esse negócio de chegar e ir abraçando não. Nem na mão se pegava. Curvava-se. Dizem que foram os mafiosos italianos que inventaram o abraço para apalpar o outro e ver se não estava armado. Tapinhas pelo corpo todo, né? Bela invenção o abraço.
Melhor que o abraço, só o abraço apertado.