Sacanagem com Plutão

Plutão, por ser o caçula dos nossos planetas (foi descoberto em 1930), era o meu preferido. Talvez por ser o mais jovem, o menor, o mais diante. Desde criança eu gostava dele. E não só eu. O lúdico Walt Disney colocou o nome de Pluto naquele personagem lunático mais do que simpático. Sim, Plutão em inglês é Pluto. Foi o único planeta distinguido pelo mestre Disney. Ainda bem, porque poderíamos ter o Tio Saturno, no lugar do soturno Tio Patinhas. E a Minnie? Mercúria.

Agora imaginem a cena: Assembléia Geral da União Astronômica Internacional (IAU). 2.500 cientistas, de 75 países (devia ter algum brasileiro lá) decidiram por unanimidade, reunidos em Praga, na República Tcheca, expulsarem Plutão do nosso sistema solar e, principalmente da nossa memória geográfica e afetiva. Unanimidade. Ou seja, não teve um sujeito, um único cientista para defender o pobre e inofensivo planeta.

Primeiro implicaram que ele estava diminuindo de tamanho. Estava menor que a nossa Lua. E daí, problema dele, ficar menor ou não. Segundo, implicaram que Plutão e a lua dele, orbitavam face a face, não como nós que, de vez em quando damos as costas para a lua. Qual é o problema deles ficarem eternamente se olhando, olhos nos olhos?

E tem um outro probleminha. As pessoas que fazem horóscopos. Como fica o pessoal que era regido por Plutão? Pense nisso. Mudam os signos, os destinos?

E sabe como os 2.500 cientistas se referiam a Plutão?: planeta anão. Puro preconceito! Tem mais: estavam irritados porque os oito planetas que sobraram (até quando?) surgiram na mesma época. E Plutão foi alguns bilhões de anos depois. Aqui, preconceito com os mais jovens.

Outra coisa. Abolindo Plutão do nosso mapa, foi também expulsa a lua dele. Olha que nome lindo pra lua: Caronte. O nome veio de um mitológico barqueiro de antes dos gregos e que levava na sua barquinha os recém-mortos, através de um rio até o lugar onde deveriam descansar. Era costume grego colocar uma moeda sobre cada olho do Caronte, como gorjeta.

Caronte, o barqueiro, está ilustrado por nada mais nada menos que Gustave Doré na Divina Comédia do Dante. Gustavo Goré que, entre outros, ilustrou livros de Balzac, Cervantes, Rabelais, Poe, a Bíblia, Chapeuzinho Vermelho, O Gato de botas, A Bela adormecida e Cinderela, retratou Caronte. Ou seja, era uma lua de certo respeito, intelectualizada. E não como a nossa que nem nome tem.

Outro argumento dos 2.500 cientistas é da forma pouco ortodoxa da sua órbita, cuja inclinação não é paralela à Terra e aos outros sete planetas. Mas quem é que me garante que a inclinação de Plutão é a única certa e a dos outros é que estão tortas?

Plutão também foi desqualificado pelos gênios porque um trecho de sua órbita se sobrepõe à de Netuno. Mas eu pergunto? Netuno reclamou? Então.

Como se essa palhaçada toda não bastasse, li no Estadão, que o senhor Jocelyn Bell Burnell, um especialista em estrelas de nêutrons que supervisionou o processo, pediu que os que se sentissem deprimidos com o resultado, olhassem para o “lado bom”. E, encerrando o assassinato planetário, afirmou:

– Pode-se argumentar que estamos criando um guarda-chuva chamado “planeta” debaixo do qual existem os planetas anões.

E provocou a risada dos outros 2.499 babacas ao abrir um guarda-chuva dentro da sala sobre um boneco de pelúcia do personagem do Disney, o Pluto.

Respeito é bom e eu gosto.

Eu, se fosse Plutão, colidia com a Terra só para mostrar para esse pessoalzinho com quantos Patetas se faz um planeta.